Uma história bela e outra menos bela
Hubert Reeves é um poeta do cosmos. Através da sua escrita de divulgação de ciência a poesia das poeiras das estrelas substancia o nosso pensamento. O distante torna-se familiar, o longe inspira-se com olhar deslumbrado. Do Big Bang até ao futuro, a sua escrita simples e cativante, aproxima-nos do Cosmos.
Foi assim ao longo de mais de uma dezena de livros de divulgação de ciência que nos ajudaram a deslumbrar e a aprender a história do Universo, que é também a de todos nós. Esses livros do astrofísico Hubert Reeves conheceram a edição portuguesa através da editora Gradiva, que os foi publicando na sua prestigiada e premiada colecção “Ciência Aberta”. O primeiro foi “Um pouco mais de azul” (número 2 daquela colecção), e o último “Onde cresce o perigo surge também a salvação” (número 205). E é este último livro de Hubert Reeves que importa visitar agora.
Esta edição portuguesa tem a tradução deste de Pedro Saraiva e a revisão científica de Carlos Fiolhais. O título, “Onde cresce o perigo surge também a salvação”, é a adaptação de um verso do poeta alemão Friedrich Hölderlin. E é o mote para a narrativa em que Hubert Reeves nos conta duas histórias: uma bela, e outra menos bela.
A bela, é a história deslumbrante de como o Universo evoluiu, desde as primeiras partículas, até à espantosa propriedade de a matéria se organizar na viva e se dotar de inteligência. Uma inteligência que nos permite contemplar o Universo e tentar compreendê-lo. Reeves conta-nos esta bela história com a escrita científica-poética a que nos habitou.
A história menos bela é sobre o efeito que aquela mesma inteligência humana teve sobre o planeta que a aninhou, causando a extinção de outras espécies, perda de biodiversidade que desequilibra perigosamente os ecossistemas. Inteligência que desenvolveu tecnologias poluentes que provocam alterações climáticas que fazem perigar a habitabilidade do nosso planeta para a vida. Hubert Reeves faz uma descrição impressiva do impacto da espécie humana sobre o planeta Terra.
Mas o nosso poeta do cosmos não se limita a apresentar estas duas histórias. Numa terceira e última parte do livro, apresenta-nos os esforços que têm sido desenvolvidos, desde há cerca de cento e cinquenta anos, para tentar conciliar as duas histórias e, com inteligência, tentar reverter os malefícios da acção humana sobre a Terra. Descreve-nos “o despertar verde” que tem permitido salvar várias espécies da extinção e restaurado a camada de ozono, entre outros aspectos marcadamente ecológicos. Fala-nos da necessidade de uma cosmoética e apresenta-nos uma ética para a Terra.
É um livro para todos e que nos ajuda a refletir sobre a nossa história e o nosso lugar no Cosmos. Que nos sensibiliza para a importância de usarmos a mesma inteligência que criou a revolução industrial, para salvaguardar o futuro da vida no único planeta que conhecemos onde ela existe. É um livro escrito com confiança e esperança na beleza da nossa inteligência.
António Piedade
© 2014 - Ciência na Imprensa Regional / Ciência Viva
António Piedade
António Piedade é Bioquímico e Comunicador de Ciência. Publicou mais 700 artigos e crónicas de divulgação científica na imprensa portuguesa e 20 artigos em revistas científicas internacionais. É autor de nove livros de divulgação de ciência: "Íris Científica" (Mar da Palavra, 2005 - Plano Nacional de Leitura),"Caminhos de Ciência" com prefácio de Carlos Fiolhais (Imprensa Universidade de Coimbra, 2011), "Silêncio Prodigioso" (Ed. autor, 2012), "Íris Científica 2" (Ed. autor, 2014), "Diálogos com Ciência" (Ed. autor, 2015) prefaciado por Carlos Fiolhais, "Íris Científica 3" (Ed. autor, 2016), "Íris Científica 4" (Ed. autor, 2017), "Íris Científica 5" (Ed. autor) prefaciado por Carlos Fiolhais, "Diálogos com Ciência" (Ed. Trinta por um Linha, 2019 - Plano Nacional de Leitura) prefaciado por Carlos Fiolhais. Organiza regularmente ciclos de palestras de divulgação científica, entre os quais, o já muito popular "Ciência às Seis". Profere regularmente palestras de divulgação científica em escolas e outras instituições.
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