Micróbios: esses pobres seres mal-amados!
Se inquiridos sobre o que lhes sugere a palavra micróbio, bactéria ou vírus, a maioria das pessoas fará de imediato a associação com sujidade, perigo, doença ou até mesmo morte! Embora esta seja uma ideia errada, temos que admitir que os micróbios* muito fizeram ao longo da História da humanidade para granjear tal fama. De facto, muitos micróbios conseguiram dizimar populações inteiras e muitas figuras poderosas da História sucumbiram à mercê de uma simples bactéria ou vírus. Uma das imagens mais marcantes dos micróbios na nossa História terá sido a Peste Negra, provocada por uma bactéria, hoje bastante mais rara e de longe menos agressiva, mas que na idade média se estima que tenha dizimado cerca de metade da população Europeia. Ao longo da História, diversas epidemias de tifo, cólera, febre-amarela ou malária foram-se sucedendo, quase sempre devastando populações totalmente indefesas. Os avanços na medicina e a consciência da importância da higiene na saúde pública foram criando espaço para um novo olhar sobre as doenças infecciosas. No nosso país, D. Pedro V (1853-1861) foi um dos primeiros reis a preocupar-se com esta temática e fundou diversas instituições públicas de saúde, entre elas, o Hospital de D. Estefânia. Por ironia do destino também D. Pedro V morreria, com apenas 24 anos, à mercê de uma bactéria. Hoje em dia morre-se menos de doenças de origem microbiana do que de outras doenças características de um mundo poluído e intensamente agitado. Contudo, os micróbios continuam ainda a pregar alguns sustos. Ainda este Verão, uma simples bactéria intestinal, particularmente agressiva e perigosa, conseguiu pôr a Europa a tremer, com receio de comer saladas cruas.
Definitivamente, os micróbios são vistos como um inimigo a abater e o marketing já se apercebeu disso. Com frequência, passa-se a ideia, quiçá errada, de que o melhor produto de limpeza e de higiene pessoal deve conter um componente qualquer que combata micróbios, germes ou bactérias. Promete-se algo que, afinal, na maioria dos casos, poderá ser conseguido com uma simples lavagem com um sabão normal. E criam-se diversas ilusões. Por exemplo, promete-se a eliminação de 99 % das bactérias, omitindo o facto de que o 1 % que fica poderá ser bem mais de um milhão, que rapidamente se multiplicará, voltando aos números iniciais. Promessas que parecem mais fantásticas do que são e que, mesmo assim, muitas vezes não poderão ser cumpridas…
A ironia de tudo isto é que os micróbios que podem causar danos são uma pequeníssima fracção de um fabuloso mundo microbiano que passa despercebido à maioria das pessoas. De facto, muitos são os micróbios que tornaram a nossa existência possível e muitos, mais ainda, aqueles que tornam a nossa vida melhor. Por exemplo, terão sido micróbios que durante milhares e milhares de anos enriqueceram a atmosfera em oxigénio, contribuindo para formar a camada de ozono que protege a Terra e que, à escala cósmica, a humanidade tem visto deteriorar-se, num abrir e fechar de olhos. Foram os micróbios que estiveram por trás da cura de muitas doenças infecciosas. E o que seria dos deliciosos vinhos e queijos e dos seus aromas característicos e diferenciadores se não fossem os micróbios?
Sem micróbios, a vida tal como a conhecemos não seria possível, e se fosse, seria bem mais desinteressante …
*Micróbio é a designação comum, dada a seres que não podem ser observados a olho nu e que pertencem a diferentes grupos: bactérias, arqueões, fungos, protozoários e vírus.
Célia Manaia
Docente e Investigadora da Escola Superior de Biotecnologia da Universidade Católica do Porto
© 2011 - Ciência na Imprensa Regional / Ciência Viva
Célia Manaia
Veja outros artigos deste/a autor/a.
Escreva ao autor deste texto
Ficheiros para download