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Um terço dos planetas gigantes detetados pelo Kepler podem ser estrelas

31 Ago 2012 - 20h25 - 2.796 caracteres

Nuno Cardoso Santos, astrónomo do Centro de Astrofísica da Universidade do Porto (CAUP), participou numa investigação europeia que sugere que até 35% dos candidatos a planetas gigantes detetados pelo satélite Kepler são afinal estrelas.

A equipa liderada por investigadores do Laboratório de Astrofísica de Marselha (LAM), usou o espectrógrafo SOPHIE, instalado no Observatório de Haute-Provence (França), para observar uma amostra aleatória de candidatos a planetas previamente detetados pelo satélite Kepler (NASA). Nesta amostra foram identificados 10 novos planetas e 5 anãs castanhas. Esta amostra foi obtida entre os mais de 2300 candidatos a planetas, detetados através de trânsitos planetários pelo Kepler.

 

No entanto, a diminuição de brilho que se observa num trânsito planetário pode ser reproduzida por outros fenómenos (por exemplo, sistemas múltiplos de estrelas), pois com este método medem-se apenas os tamanhos dos objetos, mas não é possível medir as suas massas. Torna-se por isso necessário verificar, através de outros métodos, se a diminuição de brilho é provocada pela passagem de um planeta, ou de uma estrela companheira.

 

Uma das maneiras de fazer essa verificação é com espectrógrafos de alta resolução, através do método das velocidades radiais. Alexandre Santerne (LAM) comentou que: “O SOPHIE é um dos instrumentos mais prolíficos do mundo, na medição de velocidades radiais de estrelas. Com este fomos capazes de determinar a verdadeira natureza dos candidatos a planetas descobertos pelo Kepler, e medir as massas dos objetos em trânsito.”

 

Estas observações permitiram à equipa detetar uma variedade de objetos, como “Júpiteres quentes”6, anãs castanhas7 e sistemas binários/triplos de estrelas. Para o Kepler é virtualmente impossível distinguir entre estes três casos, pois uma anã castanha, por exemplo, pode ter o mesmo tamanho que Júpiter (mas é cerca de 20 vezes mais massiva). Na amostra, 65% dos objetos eram de fato planetas, sendo 20% sistemas múltiplos, 11% binários de eclipse e 4% anãs castanhas.

 

Ou seja, cerca de 35% dos candidatos a planetas detetados pelo Kepler podem ser falsas deteções. No entanto, Claire Moutou (LAM) avisa que: “Esta taxa de “impostores” não se aplica necessariamente a planetas pequenos (cerca de 90% das deteções do Kepler), nem situações em que há vários planetas a orbitar a mesma estrela (cerca de 30% das deteções)”.

 

Para Rodrigo Díaz (LAM), “Estes planetas dão-nos novos elementos para uma melhor compreensão dos processos envolvidos na formação e evolução de planetas. E as anãs castanhas são a chave para percebermos a diferença entre planetas massivos e estrelas de pequena massa”.

 

Estes resultados foram anunciados a 31 de Agosto 2012, durante a Assembleia Geral da União Astronómica Internacional, a realizar-se em Pequim.

 

 

 

Ricardo Cardoso Reis (CAUP)

 

Ciência na Imprensa Regional – Ciência Viva

 

 

Imagens e vídeos disponíveis para download, em alta resolução em:  http://www.astro.up.pt/kepler_LAM

 

Fig1: Foto do Telescópio de 1,93 metros, do Observatório de Haute-Provence, onde está instalado o espectrógrafo SOPHIE (R.Sehling)

 

Fig2: Percentagem de planetas e outros objetos, a partir da análise do espectrógrafo SOPHIE, de entre a lista de candidatos a planetas detetados pelo Kepler. (A. Santerne)

 

Video: Animação das órbitas dos objetos estudados pelo SOPHIE (A. Santerne)

 

 

 

 

Notas Complementares:

 

As conclusões são baseadas numa série de artigos (já publicados ou em preparação), na revista Astronomy & Astrophysics:


- SOPHIE velocimetry of Kepler transit candidates II. KOI-428 b: a hot Jupiter transiting a subgiant F-star (DOI: 10.1051/0004-6361/201015764), A. Santerne et al., 2011

 

- SOPHIE velocimetry of Kepler transit candidates. III. KOI-423b: an 18 MJup transiting companion around an F7IV star (DOI: 10.1051/0004-6361/201117095), F. Bouchy et al., 2011

 

- SOPHIE velocimetry of Kepler transit candidates. IV. KOI-196b: a non-inflated hot Jupiter with a high albedo (DOI: 10.1051/0004-6361/201117807), A. Santerne et al., 2011

 

- SOPHIE velocimetry of Kepler transit candidates. V. The three hot Jupiters KOI-135b,

KOI-204b, and KOI-203b (alias Kepler-17b) (DOI: 10.1051/0004-6361/201118323), A. S. Bonomo et al., 2012

 

- SOPHIE velocimetry of Kepler transit candidates VII. A false positive rate of 35% for

Kepler close-in giant exoplanet candidates (DOI: 10.1051/0004-6361/201219608), A. Santerne et al., 2012, aceite para publicação

 

- SOPHIE velocimetry of Kepler transit candidates VIII. Five new hot Jupiter : KOI-200 b,

KOI-202 b, KOI-206 b, KOI-614 b, KOI-680 b, G. Hébrard et al., em preparação

 

- SOPHIE velocimetry of Kepler transit candidates IX. KOI-189 b and KOI-686 b : long period very low-mass companions to solar-type stars, R. F. Díaz et al., em preparação

 

- SOPHIE velocimetry of Kepler transit candidates X. KOI-205 b and KOI-554 b : two

new transiting brown dwarfs, R. F. Díaz et al., em preparação

 

 

A equipa é composta por A. Santerne (Laboratório de Astrofísica de Marselha/Observatório de Haute-Provence); C. Moutou, R. F. Díaz, A. S. Bonomo, M. Deleuil, J.-M. Almenara (Laboratório de Astrofísica de Marselha); F. Bouchy, G. Hébrard (Observatório de Haute-Provence/ Instituto de Astrofísica de Paris); Nuno Cardoso Santos (CAUP). Conta ainda com a colaboração do astrónomo amador M. Vanhuysse (Oversky).

 

O SOPHIE (Spectrographe pour l’Observation des Phénomènes des Intérieurs stellaires et des Exoplanètes, ou espectrógrafo para a observação de fenómenos no interior de estrelas e de exoplanetas) é um espectrógrafo de alta resolução, com precisão para medir velocidades radiais da ordem dos 2 metros/segundo. Está instalado no telescópio de 1,93 metros do observatório de Haute-Provence (França), o mesmo local onde em 1995 Michel Mayor e Didier Queloz detetaram o primeiro planeta extra-solar a orbitar uma estrela parecida com o Sol.

 

O Método de Trânsito consiste na medição da diminuição da luz de uma estrela, provocada pela passagem de um exoplaneta à frente dessa estrela (algo semelhante a um micro-eclipse). Através de um trânsito é possível determinar apenas o raio do planeta. Este método é complicado de usar, porque exige que o(s) planeta(s) e a estrela estejam exatamente alinhados com a linha de visão do observador.

 

O Método das Velocidades Radiais deteta exoplanetas medindo pequenas variações na velocidade (radial) da estrela, devidas ao movimento que a órbita desses planetas imprime na estrela. A variação de velocidade que o movimento da Terra imprime ao Sol é de apenas 10 cm/s (cerca de 0,36 km/h).

 

Um Júpiter Quente é um exoplaneta gasoso, semelhante a Júpiter, mas que orbita à volta da sua estrela a uma distância igual ou menor que a órbita de Mercúrio. Por isso são extremamente quentes, com temperaturas superiores a 1000 graus. Por comparação, Mercúrio está no mínimo a 46 milhões km do Sol (0,3 vezes a distância da Terra), enquanto Júpiter está no mínimo a 740 milhões km do Sol (cerca de 5 vezes a distância da Terra).

 

Uma Anã Castanha é um objeto sub-estelar, isto é, não tem massa suficiente para iniciar os processos de fusão nuclear do hidrogénio, característicos das estrelas. Há um intenso debate sobre estes objetos, pois a fronteira entre uma anã castanha e um planeta gigante gasoso não está bem definida.

 

O Centro de Astrofísica da Universidade do Porto (CAUP) foi criado em maio de 1989 e iniciou as atividades em outubro de 1990. É uma associação científica e técnica privada da Universidade do Porto, sem fins lucrativos e reconhecida de utilidade pública. Inscreve entre os seus objetivos apoiar e promover a Astronomia através da investigação científica, da formação ao nível pós-graduado e universitário, do ensino da Astronomia ao nível não universitário (básico e secundário) e da divulgação da ciência e promoção da cultura científica.
É o maior instituto de investigação em Astronomia em Portugal, com mais de 60 pessoas. Desde 2000 que é avaliado como "Excelente" por painéis internacionais, organizados pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT).

 

 


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Ricardo Cardoso Reis

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