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Entrevista a Alexandra Nobre sobre A Espiral da Vida

11 Ago 2012 - 23h28 - 4.000 caracteres

António Piedade - O livro surpreendeu-a? De que forma?

Alexandra Nobre - Paradoxalmente, sim e não. Sim, porque o livro é uma surpresa a cada esquina, que é como quem diz, a cada virar de página. Não, porque já tinha tido acesso ao “Power, Sex, Suicide: Mitochondria and the Meaning of Life” do mesmo autor, editado há uns anos e, se bem que os livros não se repitam, há algumas temáticas que se imiscuem (aliás, em “Life Ascending” Nick Lane remete para este por diversas vezes) e um estilo comum muito próprio de nos prender.

 

António Piedade - Este livro mudou algo na forma como olha agora para a evolução da vida no Universo?

Alexandra Nobre - Inevitável e irremediavelmente. Ao longo destes meses, por diversas vezes me questionei se eu elencaria estas dez invenções como as mais notáveis da evolução. “...Começamos com a origem da vida em si e terminamos com a nossa própria morte e procura de imortalidade, passando por pontos altos como o ADN, a fotossíntese, as células complexas, o sexo, o movimento, a visão, o sangue quente e a consciência...” Se bem que algumas me pareçam incontornáveis como o ADN, a fotossíntese e o sexo, outras como o sangue quente, a visão ou mesmo o movimento, à partida já não me parecem tão óbvias e consensuais. É natural que assim seja. Aliás, Nick Lane teve conselhos noutros sentidos. Por exemplo, refere “No início discuti esta lista com um amigo que me propôs o tubo digestivo como emblemático nos animais em substituição do movimento”. Mas Nick Lane, logo na introdução refere os quatro critérios que o levaram a seleccionar estas dez invenções, e legitima deste modo a sua escolha.

Inevitável e irremediavelmente, dizia eu. Mas não de modo fixo e para todo o sempre. A cada dia somos confrontados com novas “evidências”, que põem em causa verdades ainda na véspera consideradas inabaláveis. Haja curiosidade e “Curiosity” e a história da evolução da vida no Universo não terá um ponto final, e muito menos um ponto final parágrafo.

 

António Piedade - Quais as dificuldades que encontrou na tradução?

Alexandra Nobre - Por um lado, as comparações constantes ao longo do texto que tornam claros, mesmo para leigos no assunto, intrincados mecanismos bioquímicos e/ou fisiológicos, não me tornaram a vida nada fácil. Por outro, o estilo de Nick Lane, muito metafórico, rico em imagens/ figuras de estilo, pejado de duplos e de triplos sentidos que dão todo um colorido e lufada de ar fresco à escrita, também foram, por vezes, nós difíceis de desatar. Mas o osso mesmo duro de roer, o que me deixou por vezes uma mulher à beira de um ataque de nervos, foi sem dúvida arranjar paralelo para algumas expressões idiomáticas ou mesmo provérbios com que tropecei frequentemente. Tentei sempre manter o cariz humorístico, irónico e mesmo sarcástico de Nick Lane e ser o mais fiel possível ao fluir do raciocínio e das ideias. Não sei se consegui. E em simultâneo, acumulei também as funções de revisão técnica e científica. Eram muitas “antenas” sintonizadas ao mesmo tempo...

 

António Piedade - Quais são os aspectos mais conseguidos e menos conseguidos, na sua perspectiva, pelo Nick Lane, ao abordar as 10 "invenções da evolução"?

Alexandra Nobre - O mais conseguido foi o modo como a história foi sendo desenrolada, capítulo a capítulo, numa lógica coerente, com uma linguagem rica, ora mais poética, ora mais brejeira, de forma clara, agradável e com uns laivos de romance policial à mistura, que nos deixavam expectantes e mesmo em suspense, de um parágrafo para o outro. Também me agradou que, sem prejuízo desta lógica, cada capítulo se bastasse e si próprio e fizesse sentido só por si. Quero com isto dizer que, na minha óptica, podemos encarar cada um dos capítulos como um “mini-livro independente” e escolher a ordem por que os lemos, sem desvirtuar o sentido de toda a obra.

A meu ver, menos conseguido talvez seja o modo como, em todos os capítulos, mais nuns do que noutros, a dada altura começamos a andar em círculos e a repetir as mesmas ideias por outras palavras. É como se Nick Lane nos quisesse ajudar a mastigar muito bem todos os ingredientes que vai apresentando. E às tantas, é também como se já os tivéssemos engolido e fossemos obrigados a regurgitar novamente para mais uma “mastigadela”.

 

António Piedade - Pode contar-nos sobre o que experienciou ao traduzir o livro?

Alexandra Nobre - O que é que posso dizer? Que foi uma tarefa ciclópica porque: nunca tinha feito nada de minimamente semelhante; o livro é, literalmente, de peso; tive que me multiplicar (ou dividir, sei lá...) em diversas tarefas e a responsabilidade me pesava nos ombros a cada segundo. Mas também que, não obstante tudo isto, voltava a aceitar a empreitada.

 

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António Piedade

António Piedade é Bioquímico e Comunicador de Ciência. Publicou mais 700 artigos e crónicas de divulgação científica na imprensa portuguesa e 20 artigos em revistas científicas internacionais. É autor de nove livros de divulgação de ciência: "Íris Científica" (Mar da Palavra, 2005 - Plano Nacional de Leitura),"Caminhos de Ciência" com prefácio de Carlos Fiolhais (Imprensa Universidade de Coimbra, 2011), "Silêncio Prodigioso" (Ed. autor, 2012), "Íris Científica 2" (Ed. autor, 2014), "Diálogos com Ciência" (Ed. autor, 2015) prefaciado por Carlos Fiolhais, "Íris Científica 3" (Ed. autor, 2016), "Íris Científica 4" (Ed. autor, 2017), "Íris Científica 5" (Ed. autor) prefaciado por Carlos Fiolhais, "Diálogos com Ciência" (Ed. Trinta por um Linha, 2019 - Plano Nacional de Leitura) prefaciado por Carlos Fiolhais. Organiza regularmente ciclos de palestras de divulgação científica, entre os quais, o já muito popular "Ciência às Seis". Profere regularmente palestras de divulgação científica em escolas e outras instituições.


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