Os raios X há 95 anos
Nesta edição, de 2 de Março, que celebra 95 anos de existência de “O Despertar” quero deixar, para além dos votos de que conte muitos mais, o meu agradecimento pelo papel que, nos últimos anos, este jornal tem tido na divulgação de ciência.
De facto, este periódico tem vindo a dedicar espaço regular à ciência e, entre crónicas e notícias, tem contribuído para uma maior proximidade entre a cultura científica e os seus leitores.
Há 95 anos, ou seja em 1917, quando foi lançada a primeira edição desse jornal, a radiação electromagnética genericamente designada por raios X foi notícia.
Os raios X, assim baptizados em 1895 por Wilhelm Röntgen (1845-1923) por desconhecer a sua natureza, compreendem, em rigor, a radiação electromagnética de comprimentos de onda entre 0,005 e 1 nm (1 nm é igual à milionésima parte do milímetro). Desde a sua descoberta acidental que as suas aplicações nunca mais pararam de ser úteis, quer seja para compreender a íntima natureza da matéria (como é que os átomos que formam os cristais, as proteínas, o ADN, etc., estão dispostos no espaço a três dimensões) quer seja no dia-a-dia da medicina, primeiro através das radiografias, depois através das tomografias axiais computadorizadas (TAC), entre outras aplicações no estudo do Universo.
Dizia eu que, em 1917, os raios X foram notícia pelo facto de ter sido atribuído o Prémio Nobel da Física ao inglês Charles Barkla (1877-1944) pelo seu trabalho sobre a difração dos raios X por diversos elementos. Talvez o “O Despertar” tenha publicado essa notícia.
Curiosamente, um outro assunto relacionado com os raios X, nesse ano de 1917, não foi notícia nem nesse, nem em qualquer outro jornal generalista. Se tivesse sido noticiado, o conhecimento que ficou desconhecido teria poupado muito trabalho aos físicos que desenvolveram, no início dos anos 60 do século XX, os princípios do que viria mais tarde a ser designado por TAC. Estes cientistas desconheciam, aparentemente, que um matemático nascido em Děčín (hoje cidade checa), de seu nome Johann Radon (1887-1956), tinha criado, já em 1917, toda a matemática necessária para derivar dados tridimensionais a partir da combinação de um determinado número de feixes de raios X. Ou seja, Radon tinha mostrado como obter uma função a partir de uma série infinita de projecções, o que ficou conhecido por transformada de Randon na área da geometria integral.
Este é mais um exemplo da importância da comunicação de ciência quer seja inter pares, quer seja para todos. A ciência avança a ser comunicada!
Hoje, 95 anos depois endosso os meus parabéns a este jornal conimbricense.
António Piedade
Nota: há uma versão desta crónica que, ao não se referindo ao O Despertar, pode ser publicada por outros jornais.
© 2012 - Ciência na Imprensa Regional / Ciência Viva
António Piedade
António Piedade é Bioquímico e Comunicador de Ciência. Publicou mais 700 artigos e crónicas de divulgação científica na imprensa portuguesa e 20 artigos em revistas científicas internacionais. É autor de nove livros de divulgação de ciência: "Íris Científica" (Mar da Palavra, 2005 - Plano Nacional de Leitura),"Caminhos de Ciência" com prefácio de Carlos Fiolhais (Imprensa Universidade de Coimbra, 2011), "Silêncio Prodigioso" (Ed. autor, 2012), "Íris Científica 2" (Ed. autor, 2014), "Diálogos com Ciência" (Ed. autor, 2015) prefaciado por Carlos Fiolhais, "Íris Científica 3" (Ed. autor, 2016), "Íris Científica 4" (Ed. autor, 2017), "Íris Científica 5" (Ed. autor) prefaciado por Carlos Fiolhais, "Diálogos com Ciência" (Ed. Trinta por um Linha, 2019 - Plano Nacional de Leitura) prefaciado por Carlos Fiolhais. Organiza regularmente ciclos de palestras de divulgação científica, entre os quais, o já muito popular "Ciência às Seis". Profere regularmente palestras de divulgação científica em escolas e outras instituições.
Veja outros artigos deste/a autor/a.
Escreva ao autor deste texto
Ficheiros para download Jornais que já efectuaram download deste artigo