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«Escassez e irregularidade do financiamento são um dos problemas da ciência em Portugal»

20 Jul 2018 - 15h46 - 5.837 caracteres

Entrevista a Sara Marques, gestora de investigação no National Heart and Lung Institute do Imperial College London.

 

«Parece-me que os maiores problemas neste momento são, por um lado, a escassez e a irregularidade do financiamento, que depende maioritariamente da Fundação para a  Ciência e Tecnologia; e por outro, a precariedade de condições dos bolseiros.»

 

Entrevista:

 

Pode descrever de forma sucinta (para nós, leigos) o que faz profissionalmente?

 

Depois de vários anos a fazer trabalho experimental de investigação na bancada, agora sou parte da equipa responsável pela gestão e apoio à investigação no National Heart and Lung Institute que faz parte do Imperial College London. Nós gerimos a estratégia de financiamento da investigação do instituto. Esta actividade engloba uma série de áreas distintas que vão desde o desenvolvimento profissional e bem-estar dos nossos investigadores até à gestão do programa das candidaturas que submetemos, incluindo a avaliação interna dessas candidaturas. Uma grande parte do meu trabalho consiste também em preparar a candidatura do meu instituto para a Research Excellence Framework (REF), que é o sistema de avaliação da qualidade da investigação das instituições do ensino superior no Reino Unido.

 

Agora pedimos-lhe que tente contagiar-nos: o que há de particularmente entusiasmante na sua área de trabalho?

 

Aquilo que me entusiasma no meu trabalho é a variedade. Recentemente, por exemplo, discuti a implementação de um programa de mentores para os pós-doutorados e depois a estratégia geral de avaliação da ciência que produzimos e do impacto que tem na sociedade. Depois, mais especificamente, estive a investigar o tipo de ciência que fazemos e publicamos, onde a publicamos e com que frequência. Gostaríamos de ter a nossa ciência disponível e em acesso aberto, especialmente se foi financiada com fundos públicos, mas ainda não temos um sistema eficiente para o fazer, é um projecto a desenvolver a longo prazo. De certa forma, parece-me que continuo a resolver problemas tal e qual como fazia na bancada.

 

 

Por que motivos decidiu fazer períodos de investigação no estrangeiro e o que encontrou de inesperado nessa realidade académica?

 

Não houve nenhum motivo especial, apenas tinha curiosidade de explorar outros países. A primeira experiência profissional no estrangeiro foi como técnica de investigação na Califórnia. Não gostei do laboratório nem da excessiva carga de trabalho, mas fiquei impressionada com a disponibilidade de recursos e financiamento nos Estados Unidos e acabei por voltar para fazer o doutoramento. Quando entrei no GABBA  (programa graduado em áreas da biologia básica e aplicada da Universidade do Porto), a minha bolsa permitiu-me ir fazer o doutoramento no estrangeiro e decidi ir para Nova Iorque. Não encontrei nada particularmente inesperado, mas se inicialmente tive alguma dúvida de que talvez não estivesse preparada para trabalhar em institutos de investigação de ponta, rapidamente senti que a preparação que adquiri no Instituto Gulbenkian de Ciência (onde fiz o estagio), no GABBA e na Universidade de Évora (onde me formei em Biologia) era excelente.

 

Que apreciação faz do panorama científico português, tanto na sua área como de uma forma mais geral?

 

A minha apreciação resulta da informação que me chega através dos órgãos de comunicação social e tem sobretudo a ver com a área da biomedicina, em que trabalho. Parece-me que os maiores problemas neste momento são, por um lado, a escassez e a irregularidade do financiamento, que depende maioritariamente da Fundação para a  Ciência e Tecnologia; e por outro, a precariedade de condições dos bolseiros. Tendo em conta este panorama, observo com prazer a capacidade com que os investigadores portugueses na área da biomedicina conseguem assegurar financiamento europeu. Penso que esse sucesso possivelmente reflecte a qualidade dos programas doutorais portugueses e o retorno do investimento na formação de investigadores.

 

Que ferramentas do GPS lhe parecem particularmente interessantes, e porquê?

 

Creio que claramente possibilita a conexão de investigadores portugueses, mas parece-me que, mais do que isso, pode ser um repositório de dados muito interessante. Parece-me útil saber onde estão os investigadores portugueses, em que trabalham, como se movem, que financiamento têm, como e onde colaboram, o que publicam, etc. Estes dados poderiam ajudar a informar a política de investigação e emprego científico nacional. Um exemplo simples: seria possível perceber o quão vantajosa ou necessária é a mobilidade para os investigadores? Se sim, há um período da sua carreira em que seja mais vantajoso?

 

Consulte o perfil de Sara Marques no GPS.

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