«É fácil dizer, mas fazer pesquisa e ser competitivo internacionalmente custa dinheiro»
Entrevista a Alexandre Afonso, professor na Universidade de Leiden, nos Países Baixos, onde estuda políticas públicas em países europeus.
Nascido em Lausanne, na Suíça, Alexandre Afonso é professor universitário assistente na Universidade de Leiden, nos Países Baixos. Esta entrevista foi realizada no âmbito do GPS - Global Portuguese Scientists, um site onde estão registados os cientistas portugueses que desenvolvem investigação por todo o mundo.
Pode descrever de forma sucinta (para nós, leigos) o que faz profissionalmente?
Sou professor assistente na Universidade de Leiden, nos Países Baixos. Antes de mudar-me para a Holanda em 2015, fui professor auxiliar (Lecturer) no King’s College de Londres, investigador no instituto Max Planck em Colónia, Alemanha, e no Instituto Universitário Europeu em Florença. Basicamente, dou aulas e faço pesquisa na área das políticas públicas comparadas, tentando perceber porque é que os governos tomam decisões diferentes em vários países europeus. As minhas áreas de predilecção são as politicas económicas e do mercado do trabalho. Também dou aulas na área da metodologia das ciências sociais nos nossos programas de mestrado.
Agora pedimos-lhe que tente contagiar-nos: o que há de particularmente entusiasmante na sua área de trabalho?
Tento fazer pesquisa em áreas que são relacionadas com problemas políticos actuais. Por exemplo, com colegas gregos, tentei perceber porque os partidos políticos gregos se autodestruíram quando implementaram as reformas da Troika, enquanto os partidos portugueses sobreviveram aos custos eleitorais das políticas de austeridade. Mostrámos que isso têm a ver com a estrutura dos partidos políticos: os partidos gregos dependem mais de relações clientelísticas com os eleitores. Isso quer dizer que a sua sobrevivência eleitoral depende da sua capacidade de distribuir recursos (despesa pública, empregos públicos) aos seus eleitores. Num contexto de austeridade, essa capacidade desapareceu, e foram abandonados pelos eleitores. Em Portugal, mesmo existindo tendências clientelísticas, os eleitores esperam menos dos partidos e o seu poder eleitoral depende menos de eles serem capazes de distribuir recursos. Noutros projectos recentes, também analiso as diferenças entre as reformas do mercado do trabalho no Sul da Europa, ou a estrutura social dos economistas que influenciam as políticas económicas na Alemanha e nos Estados Unidos.
Por que motivos decidiu emigrar e o que encontrou de inesperado no estrangeiro?
A minha situação é um pouco diferente porque sou luso-descendente; de facto cresci na Suíça, para onde os meus pais emigraram nos anos 1970. Mas fiquei muito ligado à região da Lousã, perto de Coimbra, onde está a minha família. Na minha área, que é bastante internacionalizada e a pesquisa faz-se essencialmente em inglês, é quase obrigatório ir para o estrangeiro e construir uma rede de colaboração internacional. O problema principal na área da investigação cientifica em muitos países é a escassez dos empregos permanentes. Há muita gente a trabalhar em contratos a prazo depois do doutoramento, mesmo até aos 40 anos e mesmo em países do Norte da Europa como a Alemanha, onde o mercado do trabalho académico é muito piramidal (poucos professores e muitos trabalhadores precários). De facto, a Inglaterra (pelo menos antes do Brexit) e os Países Baixos são uns dos poucos que oferecem empregos permanentes para jovens investigadores, e num contexto bastante aberto e internacional. Por exemplo, quase todos os nossos programas de mestrado são em inglês.
Que apreciação faz do panorama científico português, tanto na sua área como de uma forma mais geral?
Há muita pesquisa de qualidade em Portugal, e o mundo académico tornou-se mais internacional também, mas a impressão que tenho é que ainda há muito clientelismo e política, que prejudica jovens investigadores e especialmente mulheres. Isto é um problema de outros países do Sul da Europa, onde ser o protegé de um professor parece às vezes ser mais importante do que a qualidade da pesquisa ou das aulas que se dá. Como a maioria dos professores catedráticos são homens, promoções são distribuídas numa lógica de “old boys club”. O outro problema são os recursos. Ouvi falar de professores auxiliares que têm de partilhar um computador com colegas. Isso é um pouco fácil dizer, mas fazer pesquisa e ser competitivo internacionalmente custa dinheiro, e vejo claras diferenças em recursos entre Portugal e os países onde trabalhei, seja a Suíça, Holanda ou Inglaterra. Os vários mercados académicos não competem com os mesmos meios.
Que ferramentas do GPS lhe parecem particularmente interessantes, e porquê?
É uma óptima ferramenta para pôr em contacto cientistas portugueses fora do país.
Consulte o perfil de Alexandre Afonso no GPS – Global Portuguese Scientists.
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