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Sete “Terras”

23 Fev 2017 - 15h39 - 4.439 caracteres

Em 1610, Galileu Galilei iniciou a astronomia moderna ao utilizar um telescópio, que tinha ele próprio melhorado, para observar a abóbada celeste nocturna. Viu o que ninguém antes tinha podido ver só com os olhos e descobriu, exemplo maior, que o planeta Júpiter tinha quatro luas. Esta descoberta foi muito importante para suportar o modelo heliocêntrico de Copérnico, para além de deitar por terra a exclusividade de só haver lua para a Terra!

Foram precisos muitos e melhores telescópios, e cerca de 400 anos, para, em 1995, os astrónomos Michel Mayor e Didier Queloz, do Observatório de Genebra, na Suiça, detectarem o primeiro planeta noutro sistema solar que não o nosso. O planeta extra-solar, ou exoplaneta, orbitava a estrela Pégaso-51 a 50 anos-luz de distância da Terra. Descobria-se o que alguns ousados tinham previsto: os planetas que rodeiam o nosso Sol não são os únicos no Universo!

Depois de duas décadas, já foram detectados mais de 3500 exoplanetas e os astrónomos e astrofísicos estão convencidos de que pelo menos a maior parte das estrelas serão orbitadas por planetas.

No início de 2015, um artigo de uma equipa internacional com vários cientistas portugueses, cujo primeiro autor é o português Tiago Campante, da Universidade de Birmingham, no Reino Unido, divulgava a descoberta de cinco planetas rochosos, com tamanhos entre Mercúrio e Vénus, no sistema solar Kepler-444. Intensificava-se a procura de planetas semelhantes à nossa Terra, que orbitem a sua estrela na zona dita habitável, em que a existência de água no estado líquido é teoricamente possível.

Em Maio de 2016, uma equipa internacional liderada por Michaël Gillon, e da qual fazia parte Didier Queloz, publicou, num artigo na revista Nature, que à volta da estrela Trappist-1, uma anã vermelha com apenas 8% da massa do Sol e situada a 39 anos-luz da Terra, tinham sido descobertos três planetas do tamanho do nosso planeta azul. Esta descoberta mobilizou astrónomos de todo o mundo e muitos telescópios - desde o telescópio espacial Spitzer, da NASA, até telescópios situados no Chile, em Marrocos, no Havai, em Liverpool, nas Canárias e na África do Sul – que passaram a escrutinar como nunca antes a estrela TRAPPIST-1.

E o resultado deste esforço observacional astronómico foi agora publicado, novamente na revista Nature (http://www.nature.com/nature/journal/v542/n7642/full/nature21360.html), e é uma descoberta extraordinária: TRAPPIST-1 tem pelo menos sete planetas de tamanho semelhante ao da Terra e três deles situam-se na zona habitável. Os seus nomes são TRAPPIST-1b, c, d, e, f, g, h, por ordem crescente de distância à estrela.

“Descobrimos que cinco dos planetas (b, c, e, f, g) têm tamanhos semelhantes à Terra, enquanto os outros dois (d, h) têm um tamanho intermédio entre Marte e a Terra. A massa estimada para os seis planetas mais interiores sugere a existência de composições rochosas”, pode ler-se no artigo cujo autor principal é de novo Michaël Gillon e de cuja equipa faz parte a portuguesa Catarina Fernandes, que está a fazer o doutoramento em astrofísica na Universidade de Liège, na Bélgica.

Esta descoberta já está a mobilizar mais meios telescópicos. O telescópio espacial Hubble já está a estudar a composição das eventuais atmosferas dos planetas do sistema solar TRAPPIST-1. E muita expectativa se existe sobre o que é que se poderá descobrir com a próxima geração de telescópios, como o telescópio espacial James Webb (da NASA) e o Telescópio Europeu Extremamente Grande (do ESO). Estes irão procurar moléculas compatíveis teoricamente com a existência de uma actividade biológica.

As questões sobre a existência de vida extraterrena elevam-se, assim, para além do sonho que a ciência fertiliza.

 

António Piedade


© 2017 - Ciência na Imprensa Regional / Ciência Viva


António Piedade

António Piedade é Bioquímico e Comunicador de Ciência. Publicou mais 700 artigos e crónicas de divulgação científica na imprensa portuguesa e 20 artigos em revistas científicas internacionais. É autor de nove livros de divulgação de ciência: "Íris Científica" (Mar da Palavra, 2005 - Plano Nacional de Leitura),"Caminhos de Ciência" com prefácio de Carlos Fiolhais (Imprensa Universidade de Coimbra, 2011), "Silêncio Prodigioso" (Ed. autor, 2012), "Íris Científica 2" (Ed. autor, 2014), "Diálogos com Ciência" (Ed. autor, 2015) prefaciado por Carlos Fiolhais, "Íris Científica 3" (Ed. autor, 2016), "Íris Científica 4" (Ed. autor, 2017), "Íris Científica 5" (Ed. autor) prefaciado por Carlos Fiolhais, "Diálogos com Ciência" (Ed. Trinta por um Linha, 2019 - Plano Nacional de Leitura) prefaciado por Carlos Fiolhais. Organiza regularmente ciclos de palestras de divulgação científica, entre os quais, o já muito popular "Ciência às Seis". Profere regularmente palestras de divulgação científica em escolas e outras instituições.


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